Na administração pública é importante a afinação entre o verbo e a verba.
O verbo sem a verba é um ser sozinho. Não adianta propagandear que se vai fazer mil coisas se não houver lastro no planejamento e na disponibilidade de verbas para sua execução. Todo administrador sabe que os recursos públicos são finitos e a demanda infinita. O cobertor é maior do que o corpo e é necessário decidir o que será coberto e o que ficará descoberto. Se assim não for, o verbo do anúncio programático da administração logo se tornará pó de promessa não cumprida. Hoje se sabe o que o eleitor faz com quem promete e não cumpre.
A verba sem o verbo também é um ente solitário. Determinar as prioridades de investimento é o básico de qualquer administrador responsável. No entanto, de nada servem o melhor planejamento e a mais transparente execução da verba sem a devida reverberação no verbo, sem a publicização dos feitos administrativos. Aliás, servem de motivo para a verberação da oposição, ainda que medíocre como muitas que a gente conhece.
Como qualquer verbo, o verbo do administrador público requer concordância verbal. Mesmo em posições diferentes, todos os seus auxiliares devem habitar um só discurso, convergindo para a compreensão única do que seja administrar a coisa pública, fazendo política transparente. Todos devem saber das responsabilidades das vozes do coral administrativo. Sem identidade no discurso, a imagem do administrador fragmenta-se, fica difusa. Para os auxiliares desafinados, há duas alternativas: exercitar-se atrás da afinação ou ceder lugar no palco. Uma voz fora do tom põe a perder a mais bela cantata de Bach.
Dentro da lei, os auxiliares do administrador público devem atender as demandas políticas. No entanto, esse atendimento não pode sacrificar os marcos conceituais da administração, pois eles sustentam a imagem criada pelo uso competente da verba, imagem que só vingará com o trabalho da comunicação, do uso competente do verbo.
Mesmo finitas, as verbas públicas bem usadas e acompanhadas de verbos eficientes transformam-se em capital político para o administrador na eleição seguinte. Sem um trabalho de linguagem que traduza os feitos administrativos em sentimento de realização dos anseios populares, o administrador some. No máximo, ficará como uma boa experiência eleitoral.
A utilização incorreta dos recursos públicos pode até ser disfarçada por uma boa propaganda. Mas assim como o consumidor não repete a dose de um produto ruim, o eleitor impõe o ostracismo político ao mau administrador do seu dinheiro.
Por fim, o casamento do verbo e da verba não tem efeito retroativo. Se o administrador usou a verba e não usou o verbo como devia, não adianta encher o eleitor de informações às vésperas do pleito porque, mais do que um produto, imagem é um processo. E se não usou a verba como devia, é inútil usar o verbo em propagandas ou artigos de jornais para dizer que fez e aconteceu porque as palavras tropeçam em suas próprias pernas curtas.
No casamento da verba com o verbo ganham o bom administrador e a população. Na briga da verba contra o verbo perdemos todos.
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