quinta-feira, 1 de janeiro de 2009

Acordo Ortográfico

O Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, que entra em vigor hoje, foi assinado em Lisboa, em 1990, e ratificado pelo Brasil, Portugal e por outros três países de língua portuguesa.

Para quem não conhece o acordo: o trema deixa de existir, a não ser em nomes próprios. O hífen não é mais usado quando o segundo elemento começar com 'r' ou 's'. Essas letras deverm ser duplicadas (antissemita e contrarregra). Também não é mais usado quando o primeiro elemento terminar em vogal e o segundo elemento começar com uma vogal diferente (extraescolar e autoestrada). O circunflexo não é mais usado nas terceiras pessoas do plural do presente do indicativo ou do subjuntivo dos verbos crer, dar, ler e ver (creem, leem, deem). Apenas quando os prefixos terminarem em "r" se mantem o hífen (hiper-realista, super-resistente). O acento circunflexo também não é mais usado em palavras terminadas com hiato 'oo', como em enjoo e em voo. O acento agudo não é mais usado em palavra terminada em 'eia' e 'oia' (ideia, jiboia). Os portugueses deixam, por exemplo, de escrever "húmido" para escrever "úmido". Desaparecem também da grafia em Portugal o "c" e o "p" mudos, como em "acção" e "óptimo". Com a incorporação do "k", "w" e "y", o alfabeto deixa de ter 23 letras para ter 26.

Como toda proposta, a da unificação ortográfica traz debates acalorados. Entre os argumentos a favor estão a maior penetrabilidade da língua portuguesa no mundo (ainda pequena apesar de ser uma das mais faladas, quer em número de falantes quer em número de países), a ampliação do mercado editorial para os países lusófonos sem o custo da adaptação, a abertura para um entendimento entre Portugal e o Brasil sobre a certificação comum de proficiência em língua portuguesa para estrangeiros (o Brasil emite hoje o certificado CELPE-Bras, enquanto que em Portugal o único diploma válido é o emitido pelo Instituto Camões), além da expansão e do fortalecimento da cooperação educacional em língua portuguesa. Os do contra alegam que ela é insuficiente para atingir seus propósitos, uma vez que muitas palavras continuarão apresentando possíveis variantes ortográficas; sustentam que haverá uma súbita obsolescência de dicionários, gramáticas e livros, além de uma custosa reaprendizagem ortográfica por parte de uma grande massa de pessoas, incluindo crianças.

A favor ou contra, o certo é que a reforma é destinada à língua escrita e, portanto à normatização da língua culta padrão, não atingindo a oralidade dos países lusófonos. Com ou sem trema ou circunflexo, diga-se, a lingüiça/linguiça continuará dando enjôo/enjoo em muita gente. A unificação tem lá suas vantagens, mas uma língua não se estabelece no mundo por unificação ortográfica, mas por peso simbólico de sua economia e sua influência geopolítica, vide o caso do inglês e, mais recentemente, do chinês, que já começa a ser estudado devido ao seu boom econômico.

A questão estética do acordo, de fundo econômico, aponta para uma outra mais urgente, de fundo social: a do letramento, que é o uso social da linguagem, tema que merece um texto próprio e ao qual voltarei em breve. Um detalhe: agora sou doutor em linguística, sem trema.

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